Eu segurava o colarinho dele e ele o meu. Amigos dele tentavam apartar, e todos berravam, palavrões ecoando. Uns 10 moleques gritando e girando na quadra. Já faz 7 anos isso. O idiota chutou feio um amigo meu, do meu time, e roubou a bola. Não me era um bom dia, era dia de descarregar tensão. Andei até ele devagar e solei a batata da perna, golpe sujo, por trás, nem vi a bola, que se fodesse a bola. Ele virou assustado e bravo, e era eu, ele já não ia com a minha cara. O jogo parou. Sorri o sorriso mais cretino que pude, com mais desdém, com mais arrogância. Ele era mais alto, mas ainda um adolescente desengonçado, me empurrou e empurrei de volta. Segurei pelo colarinho xingando, ele fez o mesmo. Os do time (sala/série) dele vieram separar. Um amigo em comum veio ficar entre nós, estilo Michael Jackson em Beat it, e o soco que eu havia preparado praquele imbecil explode em seu queixo. Lugar errado, hora errada e coisa errada, nunca aparte briga de ninguém, eles sabem porque estão ali, não é passatempo. Alguém abaixa minhas calças. Ele e os amigos dele riem. Olho pra baixo, pra cueca azul, as pernas finas a calça nos pés. Eles riem. Olho pro cara, e só pra ele, com meu sorriso cretino. Seguro o pinto e as bolas, balançando. “Quer, viadinho?” eu digo. Eles param de rir. Levanto as calças, dou meia volta e vou indo. Ele berra, puto “Volta, seu preto! Tá com medo?”. Viro com o rosto quente, os punhos fechados e tremendo. Meus amigos tentam me segurar pelos ombros, mas eu volto. Chego bem perto dele e sussurro “A vadia da sua mãe é a coordenadora. Se eu arrebentar a sua cara eu me ferro. Você sabe. Assim é fácil pra você. Viadinho cuzão. Filha da puta viadinho”. Voltei para a minha classe, um ano mais nova que a do idiota. Ano passado o vi numa festa, aniversário do cara que soquei sem querer. Cumprimentei todo mundo, menos ele. Passei rente, encarando, esnobando. Tentei sorrir, mas devo ter parecido ainda mais nervoso. Ele me olhou sério e desviou a vista para o chão. É, eu guardo rancor. E amigos. E inimigos. Eu não esqueço. Nem ele.